segunda-feira, maio 16, 2005

A economia de Robinson Crusoé

Imaginem uma economia formada por um único consumidor, uma única empresa e 2 bens: cocos e lazer. Na verdade, esta economia é uma ilha com um único morador: o náufrago Robinson Crusoé. Nesta ilha, existe uma única empresa, a Crusoé S/A, especializada na produção de cocos (na verdade, a produção consiste em colher os cocos dos coqueiros disponíveis). A empresa tem um único acionista, Robinson Crusoé, que é também o diretor da empresa, e tem que decidir quanta mão-de-obra contratar para a tarefa da colheita de cocos.

A empresa escolhe quanta mão-de-obra contratar e quantos cocos quer produzir dado o salário vigente na ilha (que é igual à produtividade marginal de Robinson Crusoé), de forma a maximizar seus lucros.

O trabalhador Robinson Crusoé escolhe a quantidade de trabalho (a ilha não tem regulamentação do seu mercado de trabalho) como qualquer trabalhador em qualquer economia livre do mundo: ele decide quanto de seu consumo quer alocar em bens de consumo e lazer, dado o salário vigente.

Robinson utilizou o mercado para escolher a alocação ótima da economia, mas poderia, ao invés disso, ter centralizado a alocação dos recursos e dos bens da economia e o resultado seria o mesmo.

Na verdade, não é necessário usar o mercado quando só existe uma única pessoa. O Robinson ditador consegue um resultado ótimo porque conhece as reais preferências da população e, ainda por cima, tem incentivos para respeitá-las. Mas, e quando existem várias pessoas? Um planejador central, mesmo que preocupado com o bem estar da população, não tem como conhecer as preferências de todos. Primeiro porque seria inviável perguntar a todas as pessoas quais são suas preferências. Segundo, as pessoas nem sempre têm incentivos para revelar suas verdadeiras preferências: elas podem mentir para receberem um quinhão maior.

A pequena história que foi contada pode ser encontrada, com algumas variações, em livros-texto de microeconomia básica. Em todos eles, a esquizofrenia de Robinson é notada. E não me surpreende um comportamento como este. Viver numa ilha isolada deve ser realmente enlouquecedor. Mas, e se este comportamento esquizofrênico tomar proporções maiores? O que aconteceria se o trabalhador Robinson Crusoé achasse que estava sendo explorado pelo seu patrão que só está preocupado em maximizar os lucros de sua empresa e resolvesse entrar em greve! Robinson sem trabalhar, fazendo passeata na frente da Crusoé S/A, com cartaz em punho e exigindo uma audiência com a diretoria.

Ou, e se o patrão Robinson Crusoé, achando aquele trabalhador muito indolente, despedisse Robinson Crusoé? O caos estaria instalado na ilha. O PIB cairia para 0 e o desemprego seria de 100%! O diálogo seria interessante:

Robinson - Tenho observado o seu trabalho, e o senhor parece não estar se esforçando na coleta dos cocos.

Robinson - Sr. Robinson, eu me esforço sim. Mas é que eu estou com problemas em casa...

Robinson - Não podemos deixar que problemas pessoais interfiram no andamento dos trabalhos da empresa. Temos nossas metas! Aliás, tenho acompanhado os números, e pelo visto o Sr. não tem conseguido alcançar as suas metas...

Robinson - Mas não é culpa minha sr...

Robinson - Não me venha com desculpas. Não tenho visto esforço de sua parte. Passe no setor de pessoal para acertar as suas contas.

Robinson - Mas eu sou o setor de pessoal...

Sempre quis que algum destes livros-texto discutisse casos em que a esquizofrenia de Robinson passasse dos limites. Mas seus autores nunca se preocupam com isso. É uma pena.